quarta-feira, 26 de março de 2014

A Ciência e a Razão


   
O  pensamento  humano  avança.  Cada  século,  cada  povo  segue  um  conceito  de  acordo  com  o  desenvolvimento  que obedece a leis a que estais submetidos. Em qualquer campo, a nova idéia vem sempre do Alto e é intuída pelo gênio. Depois, dela vos apoderais, a observais, a decompondes, a viveis, passando, então, à vossa vida e às leis.
Assim, desce a ideia e, quando se fixa na  matéria,    esgotou  seu  ciclo,    aproveitastes  todo  seu  suco  e  a  jogais  fora  para  absorverdes,  em  vossa  alma  individual  e coletiva novo sopro divino.
Vosso século possuiu e desenvolveu uma ideia toda própria que os séculos precedentes não viam, pois estavam atentos em receber e desenvolver outras. Vossa ideia foi a ciência, com que acreditastes descobrir o absoluto, embora essa também seja uma ideia relativa que, esgotado seu ciclo, passa; eu venho falar-vos exatamente porque ela está passando.
Vossa ciência lançou-se num beco escuro, sem saída, onde vossa mente não tem amanhã. Que vos deu o último século?
Máquinas como jamais o mundo as teve (mas que, no entanto, são apenas máquinas) e, em compensação, ressecou vossa alma.
Essa ciência passou como um furacão destruidor de toda a fé e vos impõe, com a máscara do ceticismo, um rosto sem alma.  Sorris despreocupados, mas  vosso  espírito  morre  de  tédio  e  ouvem-se  gritos  dilacerantes.  Até vossa própria  ciência  é  uma  espécie de desespero metódico, fatal, sem mais esperanças. Terá ela resolvido o problema da dor? Que uso sabe fazer dos poderosos meios que  lhe  deram  os  segredos  arrancados  da  natureza?  Em  vossas  mãos,  o  saber  e  a  força  transformam-se  sempre  em  meios  de destruição.
Para  que  serve,  então,  o    saber,  se  ao  invés  de  impulsionar-vos  para  o Alto, tornando-vos melhores, para vós se torna instrumento de perdição? Não riais, ó céticos, que julgais ter resolvido tudo, porque sufocastes o grito de vossa alma que anseia por subir! A dor vos persegue e vos encontrará em qualquer lugar. 
Sois crianças que julgais evitar o perigo escondendo a cabeça e fechando  os  olhos,  mas  existe  uma  Lei,  invisível  para  vós,  todavia  mais  forte  que  a  rocha,  mais  poderosa  que  o  furacão,  que caminha inexorável movimentando tudo, animando tudo; essa Lei é Deus. Ela está dentro de vós, vossa vida é uma exteriorização dela e derramará sobre vós alegria ou dor, de acordo com a justiça, como o merecerdes. Eis a síntese que vossa ciência, perdida nos infinitos pormenores da análise, jamais poderá reconstituir. Eis a visão unitária, a concepção apocalíptica que venho trazer-vos.
Para  que  me  possa  fazer  compreender,  é  mister  que  fale  de  acordo  com  vossa mentalidade e me coloque no momento psicológico que vosso século está vivendo. É indispensável que eu parta justamente dos postulados da vossa ciência, para dar-lhe uma direção totalmente nova.
 Vosso sistema de pesquisa objetiva, à base da observação e experiência, não vos pode levar além de certos resultados. Cada meio pode fornecer certo rendimento e nada mais, e a razão é um meio. A análise não poderia chegar à grande síntese, grande aspiração que ferve no fundo de todas as almas, senão por meio de um tempo infinito, de que não dispondes.
  Vossa ciência arrisca-se a não concluir jamais e o “ignorabimus” quer dizer falência. A tarefa da ciência não pode ser apenas a de multiplicar vossas comodidades.
  Não estranguleis, não sufoqueis a luz de vosso espírito, única alegria e centelha da vida, até o ponto de tornar a  ciência,  que  nasce  do  vosso  intelecto,  uma  fábrica  de  comodidades.  Esta é  prostituição  do  espírito,  é vergonhosa venda de vós mesmos à matéria.
A ciência pela ciência não tem valor, vale apenas como meio de ascensão da vida. Vossa ciência tem um pecado original: dirigir-se apenas à conquista do bem-estar material. A verdadeira ciência deve ter como finalidade tornar melhores os homens. Eis a nova estrada que precisa ser palmilhada. Essa é a minha ciência ².
 
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Não  falo  para  ostentar  sabedoria  ou  para  satisfazer  a  curiosidade  humana,  vou  direto  ao  objetivo:  para  melhorar-vos moralmente,  pois  venho  para  fazer-vos  o  bem.  Não  me  vereis  despender  qualquer  esforço  para  adaptar  e  enquadrar  meu pensamento  ao  pensamento  filosófico  humano,  ao  qual  me  referirei  o  menos  possível.  Ao  contrário,  ver-me-eis  permanecer continuamente  em  contato  com  a  fenomenologia  do  universo.  Importa escutar verdadeiramente  essa  voz,  que  contém  o pensamento  de  Deus.
 Compreendei-me,  vós  que  não  acreditais,  vós  céticos,  que  julgais  sabedoria  a  ignorância  das  coisas  do espírito e, no entanto, admirais o esforço de conquista que o homem, diariamente, exerce sobre as forças da natureza. Ensinar-vos-ei a vencer a morte, a superar a dor, a viver na grandiosidade imensa de vossa vida eterna.
Não acorrereis com entusiasmo ao esforço necessário para  obter  tão grandes resultados? Vamos, pois,  homens de boa vontade, ouvi-me! Primeiro compreendei-me com o intelecto e quando este ficar iluminado e virdes claramente a nova estrada que vos traço, palpitará também vosso coração e nele se acenderá a chama da paixão, para que a luz se transmude em vida e o conceito em ação.
O momento é crítico,  mas  é  mister  avançar.  E então (coisa incrível para a construção psicológica que o último século imprimiu em vós)  nova  verdade  vos  é  comunicada  por  meios que desconheceis, para que possais descobrir o novo  caminho.
O Alto, que vos é invisível, nunca deixou de intervir nos momentos culminantes da História. Que sabeis do amanhã, que sabeis da razão por que  vos  falo?  Que podeis imaginar  daquilo  que  o  tempo  vos  prepara,  vós,  que  estais  imersos  no  átimo  fugidio?
Indispensável avançar, mais que isso não vos seria possível. As vias da arte, da literatura, da ciência, da vida social estão fechadas, sem amanhã.  Não tendes mais o alimento  do  espírito  e  remastigais  coisas  velhas  que    são  produtos  de  refugo  e  devem  ser expelidos da vida. Falarei do espírito e vos reabrirei aquela estrada para o infinito, que a razão e a ciência vos fecharam.
Ouvi-me, pois. A razão que utilizais é um instrumento que possuís para prover os misteres, as necessidades mais externas da vida: conservação do indivíduo e da espécie.
Quando lançais este instrumento no grande mar do conhecimento, ele se perde, porque neste campo, os sentidos (que muito servem para vossas necessidades imediatas) somente esfloram a superfície das coisas e sua incapacidade absoluta de penetrar a essência vós a sentis. A observação e a experiência, de fato, deram-vos apenas resultados exteriores  de  índole  prática,  mas  a  realidade  profunda  vos  escapa  porque  o  uso  dos  sentidos  como  instrumento  de  pesquisa, embora ajudado por meios adequados, vos fará permanecer sempre na superfície, fechando-vos o caminho do progresso.
Para avançar ainda, é preciso despertar, educar, desenvolver uma faculdade mais profunda: a intuição. Aqui entram em função  elementos  complementares  novos  para  vós.
 Algum cientista jamais pensou que,  para  compreender  um  fenômeno,  fosse indispensável a própria purificação moral? Partindo da negação e da dúvida, a ciência colocou a priori uma barreira intransponível entre o espírito  do observador e o fenômeno. O eu que observa permanece sempre intimamente estranho ao fenômeno, atingido apenas pela estrada estreita dos sentidos. Jamais o cientista abriu sua alma, para que o mistério encarasse o próprio mistério e se comunicassem e se compreendessem. O cientista jamais pensou que é preciso amar o fenômeno, tornar-se o fenômeno observado vivê-lo;  é  indispensável  transportar  o  próprio  Eu,  com  sua  sensibilidade,  até  o  centro  do  fenômeno,  não  apenas  com  uma comunhão, mas com uma verdadeira transfusão de alma.
Compreendeis-me? Nem todos poderão compreender, pois ignoram o grande princípio do amor; ignoram que a matéria é, em todas as suas formas (até nas menores) sustentada, guiada, organizada pelo espírito que, em diversos graus de manifestação, existe por toda  a  parte. 
Para compreender a  essência  das  coisas,  tereis  que  abrir  as  portas  de  vossa  alma  e  estabelecer,  pelos caminhos  do  espírito,  essa  comunicação  interior,  entre  espírito  e  espírito;  deveis  sentir  a  unidade  da  vida que irmana todos os seres, desde o mineral até o homem, em trocas de interdependências, numa lei comum; deveis sentir esse liame de amor com todas as outras formas da vida, porque tudo, desde o fenômeno químico até o social, é vida,  regida por um princípio espiritual.
Para compreender, é necessário que possuais uma alma pura e que um liame de simpatia vos una a todo o criado.
A ciência ri de tudo isso e por esse motivo deve limitar-se a produzir comodidades e nada mais.
Nisto que vos estou a dizer reside exatamente a nova orientação que a personalidade humana deve conseguir, para poder avançar.
extraído do livro: A Grande Síntese - Pietro Ubaldi
 
 
1 - V. o volume Grandes Mensagens. (1.1)
2    -  Para  compreender  esse  estilo  incomum,  é  necessário  conhecer  a  técnica  da  gênese  deste  pensamento,  mediante  a  leitura  de  outros  volumes, os primeiros, pertencentes à obra.  (1.7)